A sessão especial da Assembleia Legislativa sobre o Pedral do Lourenço, ontem, mostrou que a sociedade paraense é um pote até aqui de mágoa com o tratamento de madrasta que lhe é dispensado pela União, há décadas. Valter Casimiro Silveira, coordenador geral de Portos Marítimos do Dnit, afirmou que os compromissos serão cumpridos e que o edital da Concorrência nº 003/2013, de consultoria para estudos de viabilidade técnico-econômica e ambiental – EVTEA e elaboração dos projetos básico e executivo de engenharia de sinalização de margem, balizamento, dragagem e derrocamento da hidrovia Tocantins-Araguaia, não prejudica o cronograma traçado, mas ninguém acreditou. Os oradores que se revezaram na tribuna deram um claro recado: o Pará vai esperar que o Dnit cumpra os prazos marcados pela enésima vez e que, nesta quarta-feira, entregue a readequação do projeto feita pela Universidade Federal de Santa Catarina, e que licite a obra no próximo dia 20. Se mais uma vez se confirmar o engodo, a reação acontecerá a partir da reunião de todas as forças políticas e empresariais, inclusive com a participação dos reitores das universidades públicas do Pará.
O presidente da Alepa, deputado Márcio Miranda(DEM), abriu a sessão direcionando ao representante do Dnit as questões que a população do Pará espera ter respondidas. O deputado Raimundo Santos(PEN), autor do requerimento da sessão, sintetizou sua fala: “O discurso é breve. Longo é o período de espera, diante de tanta enganação.”
O representante do Dnit tentou convencer a plateia de que não há motivo para alarme. Mas suas próprias palavras revelaram a fragilidade de suas afirmações. Disse que “está confirmada, a priori”, a data de 20 de dezembro para lançamento da licitação da obra do derrocamento do Pedral do Lourenço, isto “se não houver problema com a concessão de licença ambiental”(!). Foi a senha para a reação em cadeia.
O professor doutor Hito Braga, que chefiou a equipe técnica da UFPA que elaborou o primeiro projeto da obra, lembrou que a readequação do projeto custeado pela Vale – cujos autores toda a comunidade científica desconhece – era para ter sido entregue na sexta-feira passada, que já falou umas trinta vezes sobre o projeto e nada se resolve. E que há questões ambientais graves.
“É uma vergonha que se questione o estudo da UFPA”, protestou o vice-presidente da Federação das Indústrias do Pará, José Maria Mendonça, comentando que recentemente participou do seminário “Rompendo as barreiras do atraso”, na Confederação Nacional da Indústria, e que a Fiepa propõe que hidrovia e eclusa sejam tratadas como compensação ambiental quando da construção de usinas hidrelétricas. “Só no Brasil vigora essa prática calhorda(barragem sem eclusa). Estamos pagando pra ver. Porque toda vez que se fala que ainda não saiu a licença ambiental é porque a obra não vai sair”.
Mesmo sendo da equipe do governo federal, Adalberto Tokarski, superintendente de navegação interior da Antaq, reconheceu que a obra, de importância crucial para o desenvolvimento socioeconômico do Estado do Pará, vem sendo postergada há anos, e a licitação é uma decisão política.
Ironizando o fato de a Codomar – Companhia Docas do Maranhão, e não a CDP- Companhia Docas do Pará, licita o EVTEA e os projetos básico e executivo de engenharia de sinalização de margem, balizamento, dragagem e derrocamento da hidrovia Tocantins-Araguaia, o presidente da Frente Parlamentar de Navegação e Portos no Pará, deputado Ítalo Mácola(PSDB), convidou o deputado Raimundo Santos e a Frente Parlamentar de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável da Mineração no Pará para irem juntos até o senador José Sarney(PMDB) pedir apoio na luta pela hidrovia. E desabafou: “O projeto da Universidade Federal de Santa Catarina será quatro vezes o da UFPA. Como é que o estudo ambiental – com todo o respeito – será feito nas coxas? Estamos cansados de falar as mesmas coisas. Dia 20 é sexta-feira, praticamente último dia do ano, dia 24 é Natal. Não acredito que (a obra) vá sair. A desculpa será que tentaram fazer, mas não havia licenciamento.”
Presidente do Sindarpa, o sindicato das empresas de navegação, Eduardo Carvalho disse que entra governo, sai governo, mudam os nomes, cada um apresenta um projeto e nada acontece. E pôs o dedo na ferida: “por que o Dnit aceitou que a Vale, que tem o monopólio da ferrovia, pagasse o projeto do Pedral do Lourenço? Por que não a CNI, o Sindarpa, o Governo do Pará, que se ofereceu? Há aí um grande conflito de interesses. Saímos do rodoviarismo para o ferroviarismo. Cada ano pagamos quatro Pedrais do Lourenço e ainda sobra. Nós somos donos do nosso Estado. Temos que bater para que não se construa mais hidrelétricas sem eclusas. Sugiro que a gente “coloque o bode na casa deles”, fustigou.
No mesmo clima de indignação, o deputado Edmilson Rodrigues(PSOL) entende que é preciso uma nova Cabanagem para fazer valer os direitos do Pará que estão sendo vilipendiados.
O presidente da Companhia de Portos e Hidrovias do Pará, Abraão Benassuly, também bateu forte, chamando atenção para o fato de que o Maranhão não consegue administrar nem seu porto e está encarregado do processo licitatório da hidrovia Tocantins-Araguaia.
A secretária adjunta de Indústria, Comércio e Mineração, Maria Amélia Enriquez, citou o falecido economista Armando Mendes, que em seu último discurso comparou a Amazônia à Geni de Chico Buarque: quando se precisa de alguma coisa, são muitas as promessas. Depois, todo mundo atira pedras. E completou destacando que a taxa de pobreza no Pará é de 40%.
O deputado Raimundo Santos frisou que o atraso já causou perdas incalculáveis para a sociedade paraense, com o agravante de que agora, ao invés de ser licitada a execução da obra, aproveitando a licença ambiental já concedida, como reiteradamente prometido ao Governo do Pará, à bancada federal paraense e à Alepa, novos entraves ameaçam retardar no mínimo por mais dois anos a hidrovia, isto se os estudos concluírem pela viabilidade e se os novos projetos básico e executivo obtiverem o licenciamento ambiental.
Ao final da sessão, Adalberto Tokarski recebeu o título honorífico de Cidadão do Pará e, em seu agradecimento, fez homenagem póstuma aos empresários de navegação Luiz Ivan Janau Barbosa e Luiz Rebelo. O auditório João Batista ficou lotado. Entre os presentes, estavam a presidente da Soamar – Sociedade Amigos da Marinha, Milva Rebelo; o diretor da CPH, Haroldo Bezerra; o prefeito de Marabá, João Salame e a deputada Bernadete ten Caten, líder do PT na Casa.
Fonte: Franssinete Florenzano